segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Sobre A Rosa de Versalhes e o fenômeno Pop

(Como disse anteriormente, vinha planejando escrever sobre A Rosa de Versalhes faz algum tempo, uma vez que esse ano a estória de Oscar François Jarjayes completa 40 anos. Mas uma vez que eu tenha comparecido ao evento de ontem me parece impossível escrever apenas uma resenha do que assisti, então farei desse texto um pequeno resumo do que foi debatido ontem, para quem perdeu.... faço uso de muito conhecimento adquirido por meio da Cristiane Sato, e de observações feitas no estudo da Valéria Fernandes que trabalhou a estória de Oscar com enfoque na sua conotação feminista).


Influências e o Japão pré Oscar.
Scaramouche 1952

Em 1932  Stefan Zweig publica sua obra Maria Antonieta - O retrato de uma mulher comum, e se torna o primeiro historiador a retratar Maria Antonieta de um modo mais humano, uma jovem despreparada para ser rainha, mas não uma bruxa.
A estória da Rosa de Versalhes foi escrita em 1972 por uma jovem de 24 anos chamada Riyoko Ikeda, que  vivia em um Japão em ascensão econômica; as indústrias se desenvolviam e grande parte da população era composta por operários, o mangá já havia conseguido seu espaço, especialmente entre as crianças da época, e tinham suas histórias divididas por gênero. Um era escrito para meninos, outro para meninas.
Na maioria dos mangás para meninos a trama flertava com a aventura e era contada em terceira pessoa (isso continua presente ainda que não seja norma), enquanto as estórias femininas eram focadas em romances melosos e garotas jovens, tais quais as leitoras em questão, o mangá servia de escape de uma realidade dura.
Muitas vezes, personagens com estilo europeu eram presentes nas estórias, uma vez que o cinema hollywoodiano já era forte mundialmente, e os grandes musicais vendiam uma imagem idealizada do ocidente.
O Rei e eu 1956
Apaixonada pela biografia de Maria Antonieta, escrita por Stefan Zweig, Riyoko Ikeda decidiu criar um mangá que contasse a vida da Rainha da França tal qual ela havia descoberto na obra de Zweig.
Buscando referências em livros de história na hora de construir o visual e reproduzir o palácio de Versalhes, Riyoko também se dedicou a absorver a estética do cinema ocidental para compor suas personagens. Espectadoras de filmes como O rei e Eu e Scaramouche as autoras japonesas passaram a incorporar a estética exagerada de tais filmes.
O real, general Jarjayes;
Riyoko sofreu, no entanto, resistência de seu editor, que não acreditava que uma estória tão distante da vivida pelas leitoras iria vender, ainda mais com um final tão dramático, surge então Oscar, a filha caçula do general François-Augustin Reynier de Jarjayes, que realmente existiu e dedicou sua vida a guarda real Francesa.

Sobre a estória de A Rosa de Versalhes

Nascida a quinta filha do general Jarjayes, Oscar é criada como um homem por seu pai que se vê aflito por não deixar um sucessor na guarda real. Como era de costume na época que cada jovem tivesse uma dama de companhia, Oscar é acompanhada com um pajem, Andre Grandier que se torna seu fiel e amigo.
Aos 14 anos, já uma talentosa espadachim, Oscar recebe a missão de cuidar da proteção da Delfina Maria Antonieta, que viria da Áustria se casar com o delfim da França.
E assim surge uma forte amizade entre as duas. Oscar, inicialmente reluta em assumir a função de militar, mas uma vez apresentada a princesa, ela devota a ela sua total atenção, como um samurai a seu mestre; a Rainha por sua vez, se encanta com a postura e elegância de Oscar a torna sua amiga.
Os primeira parte da estória é dedicados a recém chegada Maria Antonieta, sua vida em Versalhes, sua aproximação e de Luis XVI, sua briga por poder político dentro do palácio, uma vez que Madame du Barry era a queridinha do rei, seu primeiro encontro com o conde Hans Axel Von Fersen em um baile de máscaras e entre outros acontecimentos  da biografia da rainha.


Uma vez que a personagem de Oscar passou a tornar-se mais popular, ela acabou ofuscando a rainha e se tornando a verdadeira, rosa de Versalhes.
Oscar nasceu nobre e frequentou a corte Francesa desde muito cedo, assim como seu pai, sua fidelidade a família real é indiscutível, mas uma vez que seu melhor amigo é Andre, um plebeu, Oscar acaba se encontrando com personagens pró revolução, tais como Robespierre, Saint-Just e Voltaire.
O crescimento das personagens é notável diante de dos olhos do leitor e ao fim da trama, temos uma rainha muito diferente da princesa mimada a quem fomos a presentados, e uma Oscar que decide seguir os ideias revolucionários. Oscar se torna uma espécie de ronin, um samurai sem mestre.
A amizade das garotas, no entanto, não é abalada apesar da necessidade da separação.
Como forma de não dar nenhum spoiler sobre a série, não continuarei a citar episódios e o desenrolar da narrativa; mas para aqueles apaixonados por Revolução Francesa, vale dizer que Jeanne de Valois-Saint-Rémy, e o Cardeal Rohan são personagens importantes, assim como a Madame Polignac. 
Uma vez que o biografo que serviu de fonte maior para a criação da obra, toma o romance de Maria Antonieta e o Conde Fersen como fato, este se torna também, um dos personagens de maior destaque e carisma na série.


A inovação entre os mangás femininos.



A Rosa de Versalhes foi pioneira em muitos campos, a começar por ter a primeira cena de sexo em um mangá, e por tratar de um assunto como o adultério sem julgar as personagens envolvidas.
Outra inovação é a própria Oscar. Embora a personagem da princesa-príncipe tenha aparecido pela primeira vez em A Princesa e o Cavaleiro de Osamu Tezuka, é em A Rosa de Versalhes que o gênero é tratado com maior profundidade. Oscar é criada e vista como homem e com isso consegue crescer liberta das privações e dificuldades que eram vistas como próprias do gênero feminino, além das amarras da sociedade a tal gênero.
Uma vez que é vista como homem e tratada como tal, é esperado que Oscar desperte a sexualidade do gênero masculino e não se interesse pelo sexo oposto, mas isso não acontece, através disso Riyoko Ikeda desassocia as duas coisas.

A vida pós BeruBara e porque é um fênomeno pop.

Vamos por partes.

A editora Shueisha recebia enxurrada de cartas de fãs de a Rosa de Versalhes durante a sua publicação, e por enxurradas eu quero dizer 10.000 cartas por dia!
Com o fim da série milhares de pessoas se viram órfãs de Lady Oscar e continuaram a enviar cartas a editora, que foi obrigada a pedir que Riyoko Ikeda escrevesse uma nova estória ou um spin-off, algo para acalmar a multidão. E assim surgiu um mangá inspirado na estória de Isabel Bathory. Mas não para por aí.
O teatro Takarazuka se encontrava em decadência na época, e decidiram adaptar BeruBara (apelido da série), para o teatro musical. O que ocorreu foi um sucesso imediato, mais de um milhão de pessoas foram ao teatro assistir a adaptação e a atriz responsável por interpretar Oscar na temporada teve seu figurino destruído por fãs que desejavam levar um pedacinho da Lady para casa.
A série também ganhou uma adaptação para cinema, dirigido por Jacques Demy, ganhador da palma de outro e foi o primeiro longa metragem a ter permissão para ser rodado dentro do palácio.
Antes de BeruBara se tornar viral na Europa, o palácio de Versailhes não figurava nem entre os três mais visitados museus da França, mas a febre foi tão grande na Europa que hoje ele é o segundo museu mais visitado no país!
O mérito de A Rosa de Versalhes é tão grande dentro da França que a autora, Riyoko Ikeda, foi a primeira pessoa da classe artística a ser convidada para um tour privado no palácio, ou seja fecharam o palácio só para ela, tal qual é feito aos chefes de estado.
Os próprios Franceses passaram a se interessar mais pela rainha e a vê-la de forma mais humana, a história se tornou de agrado do grande público.
No Japão BeruBara foi responsável por moldar a estética da nova geração, se uma vez a Europa mau representada era palco para fantasia e escapismo das leitoras, hoje ela continua consolidada e essa distância da realidade foi adotada como própria da fantasia.
A beleza Andrógina de Oscar e sua postura também fazem parte do imaginário coletivo do Japão, tal qual a beleza de Fersen.
Oscar e Maria Antonieta se tornaram personagens amados pelo público Frances que adotou a obra como deles.
Visual Kei e moda Loltia surgiram com a estética de Ikeda.
E por fim, se hoje em dia Johnny's se vestem de príncipes, eles não remetem aos príncipes da Disney mas sim a  nossa querida Lady.

Curiosidades

Ontem descobri a existência de um Dorama chamado Haken no Oscar, onde a protagonista usa referências do mangá A Rosa de Versalhes em sua vida cotidiana, parece bem divertido, também descobri que se tomarmos o trem suburbano para chegar em Versalhes ( o que é bem comum) é possível ver pichações que representam a Oscar e Maria Antonieta, e que hoje em dia BeruBara é estudado no japão tal como literatura e não mais como mangá.

Um comentário:

  1. Belissimo explanação de sua visão sobre esta grande obra de Ikeda, que guardo com muito carinho. Amo Versailles no Bara não só por conter trechos historicos importantes, mas é claro pela construção perfeita da personagem Oscar!! Uma mulher que ultrapassa todas as barrreiras de sua epoca, mas nunca deixando sua delicadeza, coragem e amor ao proximo!! E acredita vi parar aqui por motivos de pesquisa para um cosplay e fez apenas enriquecer o que já sabia. Ps: a parte que rasgaram o figurino da atriz na peça fiquei chocada, só para termos a noção do nivel dos fãs.

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